Olhou-se no espelho sem se reconhecer. Olhos sem vivacidade. A alvura do seu cabelo diferia da cor a que se habituara. Tinha sulcos vincados no rosto, como traços da vida tatuados na pele de quem vira o tempo passar por si, e não se apercebera da sua passagem. O marido perecido. Não quiseram filhos. Eram artistas noturnos. Brilhavam os dois todas as noites, dando ritmo e vida a quem rodopiava nos braços do destino. A vida muda num minuto. Saíram de moda. Deitou-se nostálgica. Estendendo o braço tombou o candeeiro nas cortinas. Rejuvenesceu eterna e flamejante nos braços do amado.
Inspirado na música: El Cuarto de Tula
No post da Cecília que me fez reencontrar com esta fabulosa e nostálgica música cubana
E também no blogue de Jordi Cébrian Cuentos de Cien Palabras. Cujo post da Isa me fez sentir saudades de o ler e de escrever Microcontos.
Ganhava sempre. A técnica era infalível. Ele sabia que a recompensa que ele mais adorava o esperava se ele ganhasse: o sorriso dela. Naquele dia algo estranho se passou e percebeu isso ao perder. No regresso a casa esperançado por um sorriso de reconforto, entendeu o que se passara. O sorriso que fora seu, era agora quem o tinha vencido.
Nascera com tudo o que se possa imaginar. Boa família, rica, amada. Bela, inteligente e bondosa. Era gentil com todos, assim, cresceu numa aura de conto de fadas. Até o namorado, um perfeito príncipe encantado.
Num fatídico acidente de viação fora única sobrevivente. Não herdou, uma fortuna, mas dívidas.
A aura de conto e fadas esfumou-se com todos ao seu redor, até o príncipe encantado.
Amparada por poucos se reergueu na vida, mas não voltou a amar.
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