ROCHA SEDIMENTAR
Disseste-me que eu conseguiria chegar ao fim da caminhada. Disseste-me que estarias sempre do meu lado para me amparar, quando tropeçasse nas pedras da calçada. Prometeste que o céu um dia seria meu. Garantiste que eu seria capaz. Ensinaste-me todos os truques para evitar inimigos, e todos os golpes para os confrontar com sucesso os adversários mais ardilosos. Fizeste a jura eterna de que jamais me abandonarias, durante toda a jornada. Mesmo que falhasse, mesmo que eu dissesse que não era capaz. Tu estavas ali. Estavas ao meu lado. A tua voz ecoava no meu íntimo e dizia-me baixinho: - Força! Eu sei que tu és capaz! E enquanto permaneceste do meu lado, eu fui capaz! Ultrapassei todas as barreiras com que deparei. Utilizei todos os teus ensinamentos. Cumpri as regras do jogo. Mas estava dependente de ti, como as lapas do mar dependem das rochas a que se agarram. Porque eu sabia que podia falhar, que tu estarias ali para me amparar.
Eu estava confiante que escalaríamos a montanha da vida juntos. Eu estava confiante. Segura que tinha onde me agarrar. Tu eras a minha rocha, a minha pedra angular. Mas desvaneceste-te. Desapareceste do meu caminho. Desfizeste-te como uma rocha sedimentar. E eu já não sou capaz de continuar, porque caí. Porque acreditei
Resta apenas o vazio. O sofrimento. A sensação de abandono, de traição. Um porquê desesperado em busca da razão. Mas eu vou sobreviver. Vou sobreviver porque já não me agarro à segurança do teu amor, da tua protecção. Eu vou sobreviver porque agora é o ódio sequioso de vingança que me guia.
Perseguir-te-ei sombria e sorrateiramente até ao fim dos meus dias. Derrotar-te-ei lenta e incessantemente, da mesma forma que o mar derrota as rochas, transformando-as
Texto de Ficção de minha autoria
Fotografia de João Palmela